Considerando que não há diferença normativa entre os contratos coletivos e individuais, reajuste deve ser considerado válido
Artigo escrito por Marina Fontes de Resende.
Fonte: JOTA
Foi pautado para julgamento na sessão da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no dia 24 de novembro o Recurso Repetitivo 1.016, cujas questões são: a) validade de cláusula contratual de plano de saúde coletivo que prevê reajuste por faixa etária; e b) ônus da prova da base atuarial do reajuste.
O recurso repetitivo está sob relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, e a relevância do tema chama a atenção de importantes instituições e associações do setor da saúde suplementar e da defesa do direito do consumidor. Ingressaram como amigos da corte empresas como Unimed, Sul América e Amil, todas operadoras de plano de saúde. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a Defensoria Pública da União e o Ministério da Saúde também são interessados no caso, juntamente com sindicatos, federações e associações de planos de saúde e de proteção ao consumidor.
A diferença do caso que será julgado na próxima semana e o tema repetitivo 952 é apenas em relação ao tipo contratual em discussão. No tema 1016 discute-se a validade da cláusula de faixa etária nos contrato de modalidade coletiva, enquanto que o tema já julgado, 952, tratou da validade da mesma cláusula nos contratos individuais.
Naquele caso, entendeu-se que não é abusiva, por si só, a cláusula que prevê o reajuste por faixa etária. No acórdão foram esmiuçados os detalhes que fazem da cláusula válida, como previsão contratual, obediência às regras regulatórias e que não sejam aplicados percentuais desarrazoados.
Na audiência pública, realizada em fevereiro de 2020, defensores da validade da cláusula argumentaram que não há razão para que o posicionamento seja diferente nesse caso, pois a Lei de Planos de Saúde e as resoluções da ANS não tratam com diferença os tipos contratuais em relação à aplicação do reajuste de faixa etária.
O acórdão que julgou o tema 952 fundamentou-se nos princípios que regem a saúde suplementar. Entendeu pela validade da cláusula com base no mutualismo contratual e na busca do equilíbrio financeiro do contrato. Considerou que cada faixa etária tem um índice de sinistralidade diferente e com o aumento do risco de sinistralidade faz-se necessário o reajuste do contrato.
Nas idades mais avançadas, há um custo exponencialmente maior, o qual é compensado pelo pacto intergeracional. Isso ocorre por meio do pagamento maior por parte dos jovens para compensar o custo dos mais velhos de forma proporcional. Caso fosse reconhecida a abusividade do reajuste de faixa etária e esse custo fosse distribuído igualmente a todos os beneficiários da carteira, haveria uma quebra do pacto intergeracional. A resposta do mercado seria a saída dos jovens da carteira, pois o prêmio não seria proporcional à renda dessas pessoas. Consequentemente, a saída dos jovens geraria um aumento ainda maior dos custos aos idosos, que terão uma carteira exclusiva de alto risco.
O desequilíbrio do contrato gera uma empresa operando em déficit, o que afastaria os investidores. A consequência é a diminuição de operadoras de menor porte e a concentração do mercado, gerando no futuro mais aumento de preço. A aplicação do reajuste é, portanto, fundamental para o equilíbrio de todo o ecossistema do setor de saúde suplementar.
Considerando que não há diferença normativa que rege os contratos coletivos dos individuais e que as características atuariais são as mesmas para os dois tipos contratuais, não há razão para tratamento e interpretação divergente do tema 1016 e do 952.
As apostas são, portanto, no sentido de que deve ser considerada válida a cláusula que prevê o reajuste por faixa etária, mas com obediência a critérios semelhantes aos aplicados no tema 952. Quanto ao ônus da prova atuarial, acredita-se que ficará a cargo das operadoras de plano de saúde, que detém mais ferramentas e meios técnicos e econômicos para apresentá-la.
MARINA FONTES DE RESENDE – Advogada, graduada pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub), mestre em Direito e Políticas Públicas pelo UniCeub, com especialização em Direito Internacional Privado, pela Hague Academy of International Law (Holanda, 2014) e em Direito do Consumidor, pela Universidad de Castilla-La Mancha (Espanha, 2018).